ENTREVISTA COM ARQUITETA E URBANISTA ADRIANA DE OLIVEIRA BORGES

ENTREVISTA COM ARQUITETA E URBANISTA ADRIANA DE OLIVEIRA BORGES

 

Adriana de Oliveira Borges (1970) é arquiteta e urbanista, e profissional autônoma desde 1995, formada pela CESUP, atual Uniderp em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Viveu e atuou no estado, desenvolvendo obras diversas como clínicas com centro cirúrgico, restaurantes, hotéis e escritórios, criando ambientes que contemplam funcionalidade, estética e integração com a natureza. No centro-oeste, Adriana projetou construções sustentáveis e resilientes às intempéries climáticas, e vem se especializando em Green Building desde 2014, quando obteve seu MBA na área.

Em 2016, Adriana mudou-se para os Estados Unidos, buscando expandir sua área de atuação. Formou-se em Business Management and Administration, e tornou-se empresária e presidente da JCAB Property LLC e da Adriana Borges PA, através das quais gerencia sua jornada para credenciamento no país. Atualmente, a arquiteta mora na Flórida, onde encontra semelhanças entre as planícies pantanosas do Everglades e o Pantanal sul-mato-grossense, no qual trabalhou anteriormente. Hoje, ela compartilha suas experiências sobre as práticas construtivas que têm marcado essa nova fase de sua carreira.

O que muda na arquitetura dos dois países que mais te chamou a atenção? 

ADRIANA DE OLIVEIRA BORGES;

Moro na Flórida, onde a arquitetura é profundamente influenciada por fatores geográficos, culturais e condições únicas de desenvolvimento e industrialização. Na minha visão, o que mais nos diferencia dos americanos é a capacidade de planejamento abrangente, construção rápida e manutenção eficiente.

Aqui, o planejamento urbano é uma questão de sobrevivência. Highways são essenciais para interligar as cidades e fornecer rotas de escape em caso de desastres naturais. Cidades inteiras às vezes precisam ser evacuadas, e os americanos aprendem com essas experiências dolorosas, tornando-se especialistas nessa área. Assim, as cidades precisam ter um crescimento ordenado, orientando a expansão urbana de forma a preservar a vida das pessoas.

Além disso, há uma preocupação em garantir que os bairros contemplem serviços como escolas, hospitais, supermercados, bombeiros, farmácias, agências bancárias, entre outros, para atender à comunidade local. Regulamentações especiais como a altura dos edifícios ajudam a garantir que a infraestrutura existente não seja sobrecarregada e que os serviços essenciais estejam facilmente acessíveis a todos os residentes. Isso é determinado por uma combinação de fatores como densidade do bairro, capacidade do sistema viário e incentivos específicos para melhorias urbanas. Portanto, a altura dos edifícios na Flórida é planejada cuidadosamente para garantir segurança, eficiência e um ambiente urbano bem estruturado.

Complementando essa abordagem, outras iniciativas como lagoas para a captação da água da chuva são implementadas para prevenir alagamentos. No período de maio a outubro, toda a região da Flórida enfrenta tempestades praticamente diárias. Toda essa água, se não contida, teria um impacto negativo nas áreas urbanas, ocasionando inundações que poderiam trazer sérios problemas no dia a dia dos moradores e turistas. A água captada nessas lagoas é reutilizada para irrigação, promovendo a sustentabilidade. Esses elementos não apenas protegem contra enchentes, mas também promovem a biodiversidade e criam espaços públicos agradáveis para atividades ao ar livre.

Entretanto, o grande diferencial no contexto americano está na industrialização, que padronizou materiais e sistematizou todo o processo de construção. Isso permite que as casas cheguem prontas para serem montadas, maximizando os benefícios ao diminuir o desperdício, agilizar a construção e economizar mão de obra. O próprio conceito da casa americana também chama a atenção. As casas são centradas na praticidade, refletindo uma mentalidade que prioriza o conforto e funcionalidade de forma econômica. Além disso, o layout é projetado para acomodar demandas diárias dentro de uma cultura que valoriza a produtividade, a cooperação e o tempo de qualidade em família. Essas necessidades se manifestam no conceito aberto que promove a convivência e na implementação da tecnologia, facilitando as tarefas diárias.

Quais as novas formas construtivas que te chamaram a atenção no local em que você está?

 

ADRIANA DE OLIVEIRA BORGES;

Devido ao processo de industrialização e ao favorecimento da montagem rápida, é comum a utilização de técnicas como Wood e Light Steel Frame. Essas técnicas envolvem o uso de peças de madeira ou metálicas pré-fabricadas, além de fechamentos externos e internos com drywall. A madeira utilizada é certificada e proveniente de reflorestamento, permitindo seu uso em larga escala, com montagem mais rápida e menos desperdício. Hoje é obrigatório na Flórida que as construções tenham paredes externas de cimento, devido à frequência de furacões, mas internamente é comum utilizar essas técnicas de construção a seco.

Esse estilo de construção é conhecido por ser leve e flexível, e uma vantagem significativa dessas edificações é a resistência a ventos fortes e baixas temperaturas. Embora possam parecer frágeis, essas construções são herméticas e bem vedadas, com telhados completamente selados.

Para o telhado, as telhas shingle são amplamente empregadas por ser uma opção barata e resistente, adaptando-se a todas as inclinações de telhado. Elas proporcionam um melhor aproveitamento do sótão e, apesar de finas, não esquentam o ambiente interno. Durante o processo de instalação, é feita uma câmara de ventilação entre o forro e o telhado, permitindo a entrada e saída de ar, e mantendo a temperatura interna agradável. Entretanto, recentemente o uso de telhas shingle vem sendo substituído por telhas de concreto, que agregam maior valor ao imóvel.

Diferentemente do Brasil, onde é possível fabricar esquadrias de qualquer tamanho, aqui elas são padronizadas e resistentes a impactos, com dimensões pré-definidas e precisam ser aprovadas pelo governo. Elas são equipadas com vidros duplos, oferecendo conforto termo-acústico e proteção contra a pressão do vento. Além disso, as portas externas de residências e estabelecimentos comerciais abrem para o lado de fora, proporcionando segurança extra em caso de ventos fortes e furacões.

O que difere a arquitetura de interiores no Brasil e nos Estados Unidos? 

 

ADRIANA DE OLIVEIRA BORGES;

As demandas diárias dos americanos se dão em torno de um estilo de vida marcado pela jornada de trabalho e escolar, no qual os momentos em família durante o café da manhã e jantar são altamente apreciados. Isso se reflete no layout das casas onde o conceito aberto integra espaços como cozinha, estar e jantar, promovendo a convivência em família. A ergonomia no design cria espaços amplos e multifuncionais como a cozinha tradicional americana – considerada o coração da casa – equipada com ilhas ou penínsulas planejadas, despensa, fogão, microondas, geladeira e máquina de lavar louças. Para facilitar a logística, a lavadora e secadora de roupas são estrategicamente localizados no hall dos quartos. Closets e walk-in closets são equipados com aramados, devido a preferência por roupas penduradas proporcionando uma vida mais independente, sem a necessidade de passar.

Os acabamentos são utilizados de forma objetiva, de fácil aplicação, sendo comum encontrarmos azulejos nas cozinhas e banheiro somente nas áreas molhadas. Além disso, texturas são aplicadas em paredes e tetos visando, ao mesmo tempo, corrigir falhas, baratear o processo e economizar tempo. Já o piso dos quartos e da área íntima da casa, é geralmente revestido com carpete, enquanto no restante da casa  encontramos piso cerâmico ou vinílico. Nas casas com dois pavimentos o layout oferece acomodações completas no térreo para idosos ou pessoas com problemas de mobilidade, e nestes casos, a escada de acesso ao segundo pavimento também é revestida com carpete, com o propósito de evitar acidentes.

A arquitetura americana também reflete a influência inglesa em elementos clássicos como colunas, papéis de parede florais, gabinetes com portas almofadadas, abajures e lustres elegantes e uma paleta de cores quentes. Mesmo nas construções contemporâneas, esses elementos tradicionais são frequentemente incorporados. O estilo harmoniza o clássico com o contemporâneo, preservando a herança histórica enquanto atende às demandas da vida atual.

Você sempre valorizou a arquitetura sustentável, o que mudou na sua forma de projetar e ver a arquitetura nos dias atuais? 

 

ADRIANA DE OLIVEIRA BORGES;

Sempre busquei estabelecer uma conexão sólida com a cultura local, incorporando métodos e materiais típicos da região sul mato-grossense em meus projetos. Priorizo a reciclagem e o reuso de materiais, pela questão da consciência ambiental e valorização dos recursos disponíveis.

Minha abordagem é contemporânea, pois concentro-me em resolver de forma prática os desafios reais que as pessoas enfrentam em seu dia a dia, sempre considerando a viabilidade econômica. Isso quer dizer não atender apenas às necessidades imediatas, mas criar soluções acessíveis e sustentáveis a longo prazo, proporcionando qualidade de vida de maneira eficiente.

Hoje também percebo a arquitetura como uma ferramenta vital para enfrentar os desafios da vida moderna. Como arquitetos, temos o papel fundamental de facilitar e resolver questões concretas, indo além da estética para criar espaços que promovam a sustentabilidade, a eficiência e o bem-estar.

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